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TRABALHO DIURNO
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Esvaziei a tarde do sol que a enchia;
tirei a luz do céu, balde após balde,
e deitei-a para o poço sem fundo
onde ela caía, num baque surdo,
espalhando pedaços de brilho
pelas paredes húmidas. Quando
o dia ficou sem luz, tapei o poço
com a tampa, e perguntei se alguém
precisava de ser iluminado. Vinham
ter comIgo; e perguntavam-me quanto
custava um grama de sol. Eu dizia-lhes:
«É mais caro do que a noite.» Mas eles
não se importavam, e juntavam-se
à minha volta, para que eu voltasse
a abrir o poço. E eu, sabendo que
a corda do meu balde não dava para
chegar ao fundo, pedia-lhes que
se atirassem para dentro do poço,
atrás da luz, se não queriam
a noite. Mas eles recusavam; e
afastavam-se na obscuridade,
deixando-me sozinho. Então, levantava
a tampa do poço - e via, lá no fundo,
a última luz a desaparecer no abismo.
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Nuno Júdice
A Matériado poema
1ª edição - Abril de 2008
Publicações Dom Quixote
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sábado, outubro 18, 2008
Trabalho diurno
Publicada por
Teresa lucas
à(s)
12:28
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2 comentários:
Nuno Júdice é daqueles poetas que nos enfeitam a alma com as suas viagens metafóricas.
Adoro esse poeta! Bela escolha, como sempre!
Beijos,
Pois...tinha de ser o Nuno :) Nem vou dizer que foi uma excelente escolha :P
beijo*
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